• Sexta-feira, 19 Dezembro 2025

Inêsh Bueno: "Espero que o meu sonho chegue longe"

“My song by the river”. É este o nome do álbum estreia avançado há dias pela oeirense Inesh Bueno, de 26 anos. Trata-se de um trabalho profundamente pessoal composto por sete faixas que exploram temas como pertença, trauma, esperança e a procura de identidade. É um disco intimista, emocional e marcado por uma interpretação muito própria, onde a vulnerabilidade se transforma em música. O LOCAL entrevistou a oeirense que se assume metade portuguesa e metade espanhola embora a família seja de Saragoça.

- Sempre sonhou ser profissional da música?

- Bom, sempre tive muito indecisa do que queria fazer da minha vida como profissão, desde psicóloga, musicoterapeuta, designer, pintora, professora da pré-primária (isso até estar no meu segundo ano da primeira e a minha professora do infantário foi dar uma aula de substituição de matemática, desisti logo da ideia hahaha), mas no fundo, desde pequena que queria música, pronto profissionalmente trabalho como técnica de som e dou aulas de canto, o que está bem perto do que quero fazer. Sempre vivi no mundo da Disney, mas a vida fez com que caísse forte e feio na vida real.

- Qual o estilo musical que mais aprecia?

- Adoro metal e rock, por mais que não seja isso o que a minha música transmite na sua maioria, mas acho que o ser humano é bastante complexo e que as emoções têm que ser expressas da forma como nos sentirmos mais à vontade em faze-lo, mas quem sabe um dia terei uma banda de metal/rock progressivo.

- Integrou quantas e quais bandas?

- Já fiz parte de duas bandas, os OMKA (rock clássico ibérico), mas por falecimento do criador da banda acabou por “desaparecer” (mesmo que, num futuro próximo, queiramos agarrar no que gravámos e meter cá fora em homenagem). A outra banda foram os Callopsyah (rock alternativo) que, por motivos internos à banda e um grande ego, foi escolhido de forma impulsiva que eu saísse da banda. Com isso tive tempo para uma paixão minha: comprar um baixo e começar a ter aulas

“Fan de Hanna Montana”

⁠- Como nasceu a paixão pela música? Qual a razão ou razões de ser um refúgio?

- Desde que me lembro que cantar (e a música no geral) sempre foi parte de mim. Talvez porque o meu pai também tinha e tem essa paixão, sempre cantava e tocava guitarra ou piano. Aos nove anos, era fascinada pela Hannah Montana e comprava as revistas mensais dela, recordo-me que numa delas dizia “queres ser cantora? Primeiro passo, junta-te a um coro”, saí do quarto a correr e disse ao meu pai que queria ter aulas de canto (dito e feito). A razão pela qual acho e sei que é um refúgio é porque sempre o foi. Sofria de bullying na escola, tinha os meus pais divorciados, não me sentia bem em lado nenhum, não tinha a sensação de ter um espaço meu e seguro (nada contra, de toda a gente que conheço que tem pais separados, tive sempre a sorte de que os meus pais dão-se muito bem, mas estamos a falar de uma criança e adolescente, isso pode trazer muitas coisas à mistura). Cantar era o meu sítio de conforto, passava horas a fio no YouTube à procura de karaokes. Era a minha forma de lidar com o que sentia, coisas que talvez nem sabia gerir emocionalmente.

-  ⁠Qual é o significado deste álbum?

- Dor e solidão. Entre 2016-2023 vivi fases da minha vida bastante duras, aconteceram várias coisas que se foram acumulando e transformaram-me em alguém que hoje em dia tento não ser. Em 2020 estava pior que estragada e quase todas essas músicas foram uma “luz” no meio da minha desassociação total da vida. Em 2024, quando gravei o álbum, a dor já não era tão forte, acabei por olhar para o álbum como uma lembrança de quem era, uma nostalgia da minha vida e o quão forte as coisas más nos acabam por transformar.

-  ⁠Onde foi buscar toda a força e apoios para avançar para o álbum?

- Quase tudo ao meu namorado, Vasco Lopes (baterista no meu projeto, dos Elan Mess, Rara e DWA). Quando comecei a namorar com ele ainda estava num processo de cura, já num nível mais simpático, mas ainda estava a lidar com muita coisa. Vê-lo com tanto amor pela música e “só a fazer”, a ter ensaios, acreditar, principalmente acreditar em mim… Deu-me muita força, principalmente para falar com o Daniel Chen (guitarrista no meu projeto, Elan Mess, DWA, entre outros porque o homem não para), cujo acabou por transcrever todo o meu trabalho como quem sabe e ajudou-me a tornar isto realidade. Outra pessoa que me apoiou e foi um espaço seguro para mostrar a minha música foi a minha professora de canto, a Marta Fernandes, que quando ouviu pela primeira vez a I HAVE TO GO acreditou logo em mim e na minha arte. Não queria deixar passar que, algo que também me motivou imenso foi a minha primeira banda, os OMKA. Banda de rock clássico espanhol e português, a minha primeira experiência em banda. Hoje em dia, o grande líder da banda (Luis Fraga) já não se encontra presente entre nós, mas sem o sonho dele, talvez não seria a mesma.

- ⁠Quem é a Inesh?

- Esta Inesh Bueno (com h) nasceu em Londres quando lá estudava. Antes disso adorava cantar, escrevia uma coisa ou outra, mas esta Inesh nasceu lá. As pessoas pensavam que o meu nome tinha o h no fim, foi aí que soube logo que se fosse artista usaria o “h”. Quando voltei comecei a compor a serio, a escrever a sério. Tinha uma ideia clara de que artista queria ser: Pop Rock, Rock Alternativo, Stone Rock. Acabou por surgir o que eu sentia no momento, mas nada se deixa ficar nos limites da música. Para o álbum trabalhei sozinha, excepto baterias que nesse caso transmiti a ideia ao Vasco e ele é que criou. O solo da Tell Me If I’m Wrong foi uma ideia de um grande amigo, Miguel Matinho, estávamos um dia em casa e pedi-lhe ajuda para fazer um solo (não sou guitarrista, sei o básico para acordes e simples riffs, mais que isso é pedir muito hahaha). De resto, quando já tinha tudo quase fechado, falei com o Daniel Chen (grande músico, produtor, guitarrista, baterista, baixista, tudo!!) e perguntei-lhe se me podia dar uma ajuda enquanto produtor e guitarrista para melhorar a qualidade das músicas, ele inclusive acabou por fazer um arranjo para o quarteto pois eu tinha tudo em MIDI e mais básico. Fomos os três para estúdio, convidámos cinco artistas (quarteto de cordas + saxofone). Foi uma ótima semana no Louva-a-Deus.

- Como são trabalhados os dias os dias de hoje?

- Hoje em dia trabalho em banda, com eles os dois, mais a Sofia Correia e a Inês Correia e levamos as minhas músicas a outro nível, com arranjos diferentes e ambientes ligeiramente diferentes.

- Tem temas com letra em português?

- Infelizmente ainda não. Cantar em português nunca foi o meu forte...

- Qual a razão do tema forte do álbum ser em espanhol?
- Passei maior parte da minha vida a falar espanhol, pois andava no Instituto Español de Lisboa. Sempre que cantava em português não sentia que soava bem. Quando me deram a oportunidade de entrar nos OMKA de repente tinha que cantar em português, foi aí que comecei a conhecer-me enquanto vocalista portuguesa. Nisto, todos os meus temas escritos na minha língua materna acabaram por ficar nesse projeto, mas tenho algumas na manga a serem preparadas!

- "Guerrera de Mil Aguas" é o seu tema forte?
- É a única música do álbum que não tinha um tom triste quando a compus, vinha doutro sitio. Era bastante mais rock e ficava muito na cabeça por causa do ritmo que tinha. Quando fui compondo as músicas, sempre achei que a I HAVE TO GO ia ser o Single, o grande tema do álbum, mas quando fomos a estúdio… isso mudou completamente. A Guerrera tinha potencial, tinha caracter, tinha força e energia e acho que isso a fez destacar-se, principalmente o saxofone (pela Eunice Barbosa)!!!
- Pensa em atacar o mercado espanhol?
- Ainda não atacámos o mercado espanhol mas quero. Honestamente isto tudo de ser uma artista independente é confuso, complicado, “overwhelming” e é difícil muitas vezes saber o que fazer a seguir, ou como fazer. Queria imenso levar a minha música ao meu outro país, fazer uma tour, dar-me a conhecer.
- ⁠Aposta na música em Portugal é um risco, assim como em qualquer profissão... considera-se uma mulher corajosa, que gosta de desafios?
- Apenas acho que, depois de tantas vezes pensar que a música é meramente um sonho e de querer pôr outras coisas à frente, acabei por ver que voltava sempre à mesma narrativa: quero fazer música. Não me vejo a não o fazer e, se não resultar, vai ser doloroso, mas mais do que isso seria viver numa incerteza do “e se tivesse feito algo sobre isso?”, portanto ao menos tento.
- ⁠Qual o significado do título "My song by the river"?  
- Resumidamente, “My Song The River” significa “a vida”, o boiar nela que é como me sentia nessa época em que escrevi a maior parte das músicas, eu sendo a música, o rio sendo a vida. Remete à música que deu o nome do álbum, um poema metafórico sobre a sensação de não querer estar mais na vida, um adeus. A “I HAVE TO GO” é a sensação de um vazio em nós, a sensação de que algo falta (nós próprios) e o querer sentir a criança interior que em nós habita e que muitas vezes não a ouvimos. A “11 Times By Your Side” é uma balada, uma canção sobre amor mas não especificamente para alguém, mas sim quando um começa amar-se a si próprio, abre espaço para amar outro. A “Tell Me If I’m Wrong” é uma oração a algo maior que nós para nos ajudar a saber qual é o melhor caminho para o nosso bem estar, um desabafo sobre a história em que vive. A “Guerrera de Mil Aguas” é a força interior, uma transformação para ser mais, melhor, para se honrar. A “(the) People” faz-nos viajar para um espaço atmosférico, mas sozinho, basicamente aquela sensação quando tudo e todos à nossa volta estão ativos na vida, a viver e nós apenas sozinhos. Por fim, a “Luna en 100 años” foi uma prenda para o meu avô, quando fez 100 anos, entretanto faleceu e achei importante manter a música. O álbum começa comigo a cantar com 3 anos, e acaba com uma música dedicada aos 100 anos do meu avô, o álbum é o ciclo da vida e tudo o que faz parte nesse ciclo.
- Confiante que a letra pode ajudar o ouvinte a enfrentar este mundo, uma vez que o planeta vive dias complicados?
- Espero que sim e gostava muito. A tristeza é algo normal, há quem sinta mais que outros e há, sem duvida, quem se sinta incompreendido. Eu sempre me senti assim, sempre me senti sozinha na forma como sentia tudo (e às vezes ainda o sinto). Há muitas coisas que são estupidamente tabos de se falar, como suicídio ou tentativas de, algo que vivi e não tenho vergonha de o dizer vezes sem conta, de expor essa parte “vulnerável” em mim, porque há tanta gente que vive assim, nessa solidão. E espero que, para aqueles que ouvem as letras que se sintam de certa forma abraçados, porque foi o que as músicas fizeram por mim.
- ⁠Até onde pode chegar o seu sonho?
- Espero que o meu sonho chegue longe, mas isso é algo que não sei como responder, pois não depende só de mim. Mas gostava de levar a minha música a outros países, fazer “tornés”. Não preciso de ser estupidamente famosa, apenas conseguir elevar o “é só um sonho” a um “afinal até consigo viver disto” e transmitir a minha música a todos aqueles que estejam recetivos a ouvi-la.
- ⁠Além da música tem outra ocupação?
- Sou técnica de som, professora de canto, adoro pintar e desenhar (mesmo que não seja algo que ande a fazer por questões de tempo) e vou ao ginásio para o bem da minha saúde mental. Mas honestamente, música ocupa a maior parte do meu tempo (e estou grata por isso).
-⁠ ⁠Como foi preparar este vídeo?
- Foi muito divertido e stressante porque envolvia fogo e estávamos nervosos, mas foi das melhores memórias de 2025 que vão ficar guardadas para todo o sempre. A criação do videoclip foi pela Carolina Coelho e tivemos a grande artista de Lagos, a Inês Pissaro. Foi um dia interior de gravações, uma equipa pequenina, nada profissional, mas com garra, paixão e criatividade. Eu, pelo menos, revejo o videoclip vezes sem conta pois estou bastante orgulhosa do que foi criando em equipa.

https://www.youtube.com/watch?v=sxEJ0E44Ny8
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